Se você já jogou poker, sabe que ele vai muito além da sorte. É um jogo de raciocínio, paciência e estratégia. Mas afinal, por que o poker é considerado um esporte da mente? E o que o coloca no mesmo patamar de jogos como xadrez, damas e eSports?
Neste artigo, vamos explorar os elementos que justificam essa classificação. Além disso, mostrar porque o poker merece reconhecimento como prática esportiva intelectual.
Contribuição: André Ribeiro
Leitura: 5 min
O que é um “Esporte da Mente”?
Esportes da mente são atividades competitivas onde o desempenho está diretamente ligado à habilidade cognitiva dos participantes. Isso inclui memória, lógica, estratégia, concentração e capacidade de tomada de decisão.
Ao contrário dos esportes físicos, onde o corpo é o principal instrumento, nos esportes da mente é o cérebro que comanda o jogo.
A International Mind Sports Association (IMSA), que reúne federações de xadrez, damas, bridge e go, reconhece atividades que envolvem profundo raciocínio como práticas esportivas legítimas. O poker lutou por vinte anos até ser enquadrado como esporte da mente. Ainda que de forma provisória em 2022 pela associação, apesar de ser reconhecido desde 2010.
Atualmente, desde novembro de 2024, o poker foi internacionalmente reconhecido como um Esporte da Mente, após um parecer favorável da IMSA, em reunião no Sheraton Hotel, em São Paulo.
Poker Como Esporte da Mente: Muito Mais do que Cartas e Apostas
É comum o poker ser confundido com jogos de azar, mas essa visão é limitada. Embora haja um componente de sorte (como em praticamente todos os esportes), o diferencial está na forma como o jogador administra as variáveis do jogo.
Os melhores jogadores não vencem por receberem as melhores mãos, mas sim por saberem interpretar o adversário, controlar o pote e tomar decisões matematicamente corretas.
O poker exige capacidade de cálculo de probabilidades, leitura de comportamentos e padrões corporais, muito autocontrole emocional e uma estratégia focada no longo prazo.
Tudo isso exige um preparo intelectual constante, semelhante ao treinamento de atletas mentais.
Poker e Xadrez: Mais Próximos do que Parece
À primeira vista, poker e xadrez podem parecer mundos distintos. Porém, ambos têm muito em comum.
No xadrez, você precisa prever as jogadas do oponente. No poker você faz o mesmo, mas com a diferença de que lida com informações incompletas.
Ainda no xadrez, todos os dados estão visíveis. Já no poker, parte da genialidade está em lidar com o desconhecido.
Ambos os jogos exigem raciocínio lógico e estratégico, além de não serem baseados em sorte, e sim em decisões acertadas.
A principal diferença entre eles? O poker acrescenta o fator humano de maneira mais intensa, já que engana, blefa e testa o controle emocional do oponente a cada mão.
Se o xadrez é um duelo silencioso de lógica pura, o poker é um jogo de lógica com psicologia aplicada, e isso só o torna ainda mais complexo.
A ciência por Trás do Jogo
Diversos estudos acadêmicos comprovam que o poker é um jogo predominantemente de habilidade. Um exemplo é a pesquisa “The Role of Skill Versus Luck in Poker: Evidence from the World Series of Poker”, da Universidade de Chicago, feita pelos economistas Steven D. Levitt e Thomas J. Miles. O estudo se propôs a analisar o desempenho de jogadores profissionais e recreativos na WSOP de 2010 e comparar o ROI (retorno sobre o investimento) dos dois grupos.
Os resultados mostraram que os jogadores mais habilidosos tiveram um ROI superior a 30%, enquanto os demais jogadores finalizaram com um ROI negativo de cerca de 15%.
Outro estudo que reforça a ideia do poker como esporte da mente foi feito pelo economista Randal Heeb, pela Universidade de Yale. Heeb analisou 415 milhões de mãos de poker online para identificar o fator sorte ou habilidade.
Como resultado, concluiu-se que 75% das mãos analisadas não foram para showdown, ou seja, acabaram antes de os jogadores mostrarem suas cartas. Isso prova que a maior parte das mãos de poker são decididas antes do showdown, sem a presença de sorte ou azar.
Case de Sucesso: Daniel Negreanu
Se há um nome que representa a combinação de inteligência, estratégia e consistência no poker, esse nome é Daniel Negreanu.
Com mais de US$55 milhões em prêmios ao vivo e sete braceletes da World Series of Poker (WSOP), Kid Poker, como é conhecido, se tornou uma lenda do esporte. Não por sorte, mas por habilidade refinada ao longo de décadas.
Conhecido por sua incrível capacidade de leitura de adversários, ele é admirado por conseguir prever, com precisão assustadora, as mãos dos oponentes. Inclusive, muitas dessas previsões foram feitas em mesas televisionadas, onde qualquer um poderia assistir. Isso não é mágica, e sim psicologia, padrão de comportamento e cálculo de probabilidade aplicados em tempo real.
Negreanu também é exemplo de disciplina e estudo. Ele constantemente atualiza seus conhecimentos técnicos e é um dos profissionais mais abertos sobre sua rotina de preparo mental e físico. Costuma dizer que o poker exige o mesmo tipo de dedicação que qualquer esporte de alto rendimento.
“Poker é como xadrez com cartas. Não é sobre ter a melhor mão, mas sobre jogar melhor que os outros, diz “Kid Poker”.
Daniel Negreanu prova, com resultados concretos e consistência ao longo dos anos, que o poker é um esporte da mente e que vence quem pensa melhor, não quem tem mais sorte.
Poker Profissional: Disciplina, Estudo e Rotina
Assim como enxadristas de elite estudam milhares de partidas, jogadores profissionais de poker analisam mãos, gráficos, tendências e o comportamento de seus adversários.
Eles mantêm rotinas rigorosas de estudo teórico e prático. Estudam teoria dos jogos, matemática, estatística e psicologia. Fazem sessões de revisão de mãos e utilizam softwares que analisam jogadas com precisão.
Jogadores como Daniel Negreanu, Fedor Holz ou o próprio Felipe Mojave não construíram suas carreiras apenas com carisma ou sorte. Eles estudaram profundamente o jogo e trataram o poker como uma ciência. E claro, como um verdadeiro esporte.
Controle Emocional no Poker
Imagine perder uma mão com um par de ases para um blefe. A maioria das pessoas ficaria frustrada. O profissional, não. Ele entende que a variância faz parte do jogo e segue o baile com disciplina.
Esse domínio emocional é importantíssimo e exige treinamento. Em um ambiente competitivo, onde decisões de milhares de dólares são tomadas em segundos, manter a calma é uma habilidade tão valiosa quanto o cálculo matemático.
E isso aproxima o poker de outros esportes da mente. O psicológico é o divisor de águas entre bons e grandes jogadores.
O Esporte da Mente por Trás das Fichas
Quando observamos o poker com atenção, percebemos que ele envolve muito mais que apostas e blefes. É um campo de batalha intelectual, onde cada decisão conta.
Assim como no xadrez, a vitória no poker depende da mente, da análise e da estratégia. Por isso, ele merece seu lugar entre os esportes da mente.
Se você ainda não o vê dessa forma, talvez esteja na hora de rever seus conceitos.